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Medida Provisória reforça alinhamento do Brasil às melhores práticas tributárias internacionais
Ministério da Fazenda detalha a MP 1.262/2024, que estabelece tributação mínima de 15% sobre o lucro de multinacionais com faturamento anual de 750 milhões de euros ou mais
O Ministério da Fazenda detalhou nesta sexta-feira (4/10) a Medida Provisória (MP) 1.262/2024, publicada no dia anterior, que estabelece uma tributação mínima sobre o lucro de multinacionais que tenham faturamento anual, no Brasil, de 750 milhões de euros (R$ 4,3 bilhões) ou mais, em pelo menos dois dos quatro anos fiscais imediatamente anteriores ao ano fiscal analisado, e cuja tributação efetiva seja inferior a 15% sobre o lucro. Esses critérios fazem com que a medida atinja, hoje, 957 grupos empresariais com atuação no país. A instituição do chamado Adicional da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) se insere no processo de adaptação da legislação brasileira às Regras Globais Contra a Erosão da Base Tributária (Regras GloBE), iniciativa da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) endossada pelo G20 e pactuada por cerca de 140 países no âmbito da OCDE.
Em entrevista coletiva realizada no Escritório do Ministério da Fazenda em São Paulo, o secretário especial da Receita Federal do Brasil (RFB), Robinson Barreirinhas, a subsecretária de Tributação e Contencioso da RFB, Cláudia Pimentel, e o diretor de Programa da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária (Sert) Daniel Loria esclareceram os principais pontos da MP, que tem impacto positivo na arrecadação (R$ 3,4 bilhões em 2026 e 7,3 bilhões em 2027) e contribui para o alinhamento do Brasil às melhores práticas internacionais de tributação.
Acesse a apresentação feita nesta sexta sobre a Medida Provisória (MP) 1.262/2024, durante a coletiva em São Paulo
Cobrança do tributo no pais
As Regras GloBE fazem parte do Pilar 2 OCDE, que tem como objetivo estabelecer uma tributação mínima corporativa de 15% sobre o lucro dos grandes grupos multinacionais. Participante desse acordo global, o Brasil tem na MP 1.262/2024 o instrumento normativo que lhe possibilitará cobrar, no âmbito doméstico, o imposto que seria pago para outro país – e isso sem aumento da carga tributária global dos grupos multinacionais. A medida propõe a introdução do QDMTT (Qualified Domestic Minimum Top-up Tax) no Brasil, na forma do Adicional de CSLL . O desenho foi pensado para ser juridicamente seguro, uma vez que a CSLL incide sobre o lucro líquido das empresas.
A alíquota nominal sobre o lucro das empresas no Brasil é de 34%, sendo 25% do IRPJ (Imposto de Renda da Pessoa Jurídica) e 9% da CSLL. A grande maioria dos grupos econômicos estabelecidos no país tem uma alíquota efetiva acima de 20%. Uma minoria, porém, paga uma alíquota efetiva abaixo de 15%, consequência de incentivos fiscais ou deduções na base de cálculo dos tributos, entre outros fatores. De acordo com dados da Receita Federal, há 8.704 pessoas jurídicas operando no Brasil com receita bruta anual superior a 750 milhões de euros. Destes, 957 têm tributação do lucro com alíquotas efetivas inferiores a 15% e serão, portanto, impactados pela tributação mínima.
Medida defensiva
“Esta é uma medida defensiva do erário brasileiro”, afirmou o secretário Barreirinhas. Caso o Brasil não implementasse o QDMTT agora, perderia arrecadação para os países que sediam os grupos. “O que se busca é uma tributação no país em que atuam as entidades”, reforçou a subsecretária Cláudia Pimentel. Ela destacou que 35 jurisdições (países) já adotaram ou estão adotando as Regras GloBE em 2024 e que a expectativa é de que mais 20 façam isso em 2025.
Os esforços para a redução da subtributação, conceito basilar da MP e do acordo conduzido pela OCDE, teve um aspecto, em especial, ressaltado pelo diretor da Sert Daniel Loria na entrevista coletiva. “A medida insere o Brasil no modelo internacional da OCDE, é totalmente aderente às melhores práticas internacionais, e preza pela transparência, na medida em que induz o nosso país a repensar os nossos incentivos fiscais e reformulá-los como um crédito financeiro”. Ele destacou que a MP 1.262/2024 se insere no contexto das iniciativas do Ministério da Fazenda já executadas em relação à reforma da tributação da renda, entre as quais a Medida Provisória 1.261/2024, publicada na quarta-feira (2/10) e que trata do alongamento do prazo para dedução de perdas de instituições bancárias com o IRPJ e CSLL.
A introdução da tributação mínima será realizada por meio da MP 1.262/2024 e da legislação infralegal que a regulamentará. Essa opção, de acordo com o Ministério da Fazenda, preserva a observância dos princípios constitucionais, uma vez que os elementos indispensáveis à implementação do Adicional da CSLL estão estabelecidos em lei, e permite a atualização periódica do conjunto normativo e sua compatibilização com os documentos de referência, sem que haja necessidade de alteração da legislação primária sempre que esses documentos forem atualizados.
Pilar 2
Em 2013, a OCDE e os países do G20 constataram a necessidade de combater os planejamentos tributários agressivos das multinacionais. Esses esforços resultaram em um plano de ação, publicado em setembro daquele ano. Foram definidas 15 ações necessárias ao endereçamento de aspectos relacionados à erosão da base tributária e ao deslocamento de lucro, que compõem o Projeto BEPS (Base Erosion and Profit Shifting - BEPS).
Para tornar o projeto mais inclusivo, a OCDE e o G20 criaram o Quadro Inclusivo sobre BEPS (Inclusive Framework on BEPS), do qual o Brasil faz parte. Isso permitiu que todas as jurisdições interessadas nas discussões pudessem atuar em condições de igualdade no Comitê de Assuntos Fiscais (Committee on Fiscal Affairs) e nos seus órgãos. O Quadro Inclusivo conta atualmente com mais de 140 jurisdições; inclui, no desenvolvimento das suas atividades, organizações internacionais e entidades tributárias regionais; e realiza consultas ao setor empresarial e à sociedade civil.
Os desafios tributários decorrentes da digitalização da economia, contudo, uma das questões tratadas pelo BEPS, levaram ao anúncio, em 8 de outubro de 2021, de uma solução baseada em dois pilares. O Pilar Um propõe a reforma de algumas regras de tributação internacional para conferir às jurisdições de mercado o direito de tributar parte dos lucros das multinacionais. Já o Pilar Dois prevê a imposição de um tributo mínimo global, para garantir que os grupos multinacionais paguem uma parcela justa (fair tax) de tributos em todas as jurisdições em que atuam, tendo como um de seus componentes as Regras GloBE. “É uma nova realidade”, definiu Barreirinhas.