Notícias
Lupa nas empresas
Entre os novos procedimentos estão auditorias nos sistemas de controle interno. Neste ano, 217 firmas são alvos de apuração por parte do Fisco
A Delegacia da Receita Federal em Brasília vai dar prioridade total às investigações das contas das empresas em 2010, diferentemente do que ocorreu no ano passado. A meta é esquadrinhar o pagamento de impostos de pelo menos 217 companhias brasilienses, número que adiciona 42 firmas às 175 verificadas em 2009. Como a equipe técnica teve que se concentrar na Operação Leão Ferido 2, desbaratando uma quadrilha que fraudava a restituição do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), a apuração da sonegação de pessoas jurídicas foi deixada em segundo plano, registrando queda de 16,7% (veja tabelas). Mas o Leão promete voltar a mostrar as garras para a vida corporativa daqui por diante.
“Estamos aperfeiçoando os critérios de seleção de contribuintes para a averiguação. Nos livros e nos balanços, as empresas só nos mostram o que querem. Por isso, vamos passar a fazer auditorias nos sistemas de controle interno delas, olhando todo o processo que levou ao resultado econômico. O objetivo, no fim das contas, é fazer uma apuração que se aproxime ao máximo do tempo real”, afirma o delegado da Receita no Distrito Federal, Joel Miyazaki. A primeira investigação desse tipo já está sendo feita, em caráter experimental. Miyazaki vai também formalizar uma equipe de sete auditores fixos, que poderá ser reforçada quando preciso, para lidar apenas com a cobrança a grandes empresas.
De acordo com os dados obtidos pelo Correio, os fiscais apuraram nas empresas um crédito tributário (1)de R$ 649,11 milhões em 2009, com queda de 69,5% em relação aos R$ 2,126 bilhões de 2008. O delegado atribui essa diminuição a dois fatores. Primeiro, a atenção às irregularidades cometidas por pessoas físicas empurrou para este ano a conclusão de muitos procedimentos nas companhias. Segundo, uma mega-autuação, no valor de R$ 1,2 bilhão, distorceu os números de 2008, prejudicando a comparação. Temendo quebrar o sigilo fiscal, Miyazaki não informa nem mesmo o setor em que atua. “Em geral, esses volumes altos têm origem em impostos acumulados em vários anos”, explica.
Indústria
O setor campeão da sonegação no DF foi a indústria. Foram apenas três autuações, mas num valor total de R$ 130,891 milhões, com a maior média: R$ 43,630 milhões por contribuinte. Em seguida, veio o comércio, com 65 casos, numa cobrança global de R$ 119,873 milhões e média de R$ 1,844 milhão. Somadas às 41 revisões de declarações do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), 216 firmas foram investigadas, o que gerou um lançamento de R$ 696,560 milhões. Segundo o delegado, o foco nas empresas, pequenas, médias ou grandes, resulta em mais dinheiro a ser recolhido, mas o maior “efeito demonstração” ocorre com a investigação sobre pessoas físicas.
Sempre que um trabalhador é pego sonegando, seus familiares, amigos e colegas de trabalho tendem a ficar com medo e a pensar duas vezes antes de seguir o mesmo caminho e se expor a idêntico risco. Em 2009, o número de pessoas investigadas subiu 104,6%, muito em função da Operação Leão Ferido 2, e a quantidade de declarações na malha fina analisadas aumentou 6,2%. O valor da sonegação encontrada entre os trabalhadores deu um enorme salto de 145,8%, chegando a R$ 77,227 milhões, embora o apurado na malha fina tenha caído 7,1%, ficando em R$ 32,824 milhões. Os alvos das maiores autuações foram 22 empresários, com média de R$ 562 mil e valor global de R$ 12,359 milhões.
Os auditores multaram 239 servidores públicos e aposentados, cobrando R$ 32,889 milhões, numa média de R$ 138 mil. Com o trabalho sobre 12.517 declarações que caíram na malha fina do IRPF, ao todo a Receita autuou 13.004 pessoas, num valor total de R$ 110,051 milhões e média de R$ 8,463 mil. Os contribuintes suspeitos de sonegação podem recorrer administrativa ou judicialmente ou podem reconhecer a dívida e parcelá-la. Por isso, só uma parte do resultado da fiscalização, em geral não superior a 30%, é arrecadada no mesmo ano. Ao todo, 13.220 trabalhadores e empresas foram autuados em 2009, com alta de 7,5%. Os recursos somaram R$ 806,511 milhões, com queda de 63,4%
Os casos mais comuns encontrados pelos fiscais em Brasília foram movimentações financeiras incompatíveis ou rendimentos dos trabalhadores. Os dados do Imposto de Renda são cruzados com os das contas-correntes dos contribuintes, os gastos no cartão de crédito e os recebimentos de aluguéis, por exemplo. “Há gente que se declara isento do IR, mas movimenta recursos enormes na conta. Também existem empresas que informam receitas pequenas, mas recebem muitos pagamentos por cartão de crédito”, diz Miyazaki.
1 - Obrigação
O crédito tributário é a obrigação segundo a qual o Estado, sujeito ativo da relação jurídica, pode exigir do contribuinte pessoa física ou jurídica (sujeito passivo) o pagamento do tributo. É composto do principal do imposto devido, acrescido de multas e juros.
Drible no Leão
A Receita Federal quis dar uma punição exemplar aos contribuintes que foram flagrados tentando fraudar a restituição do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) no ano passado. A Operação Leão Ferido 2, em abril, desmantelou uma quadrilha que aumentava ou criava despesas falsas para transformar saldos a pagar em direito a devolução. A outra possibilidade era elevar o valor de quem já iria receber dinheiro de volta. A delegacia do Fisco em Brasília pegou quase mil trabalhadores utilizando o esquema, já abriu procedimentos contra 800 e concluiu mais de 400, fazendo representações ao Ministério Público para fins penais em todos eles.
Tudo girava em torno de um escritório de contabilidade, que recebia um percentual variável de acordo com os recursos obtidos. “Demos prioridade total a esse caso. Não dava para ser diferente. O sujeito chegava a distribuir folhetos na frente dos órgãos públicos oferecendo seus serviços, numa cara de pau sem tamanho. Se essa prática se espalhasse, seria um horror”, justifica o delegado da Receita no DF, Joel Miyazaki. Até agora, as autuações somam R$ 37 milhões. “Fizemos lançamentos até pequenos, de R$ 1 mil, por exemplo. Só para mostrar ao contribuinte que vimos o que ele fez e que não o deixaríamos impune.”
Essa e outras operações do gênero motivaram uma mudança na legislação tributária. Antes, quem era detectado fraudando a devolução do IRPF estava sujeito ao recolhimento da parcela que recebeu indevidamente, acrescida de multa de 20%, mais a correção pela taxa básica de juros (Selic). Desde dezembro do ano passado, com a edição da Instrução Normativa (IN) nº 981, a multa para essa irregularidade subiu para 75%, podendo chegar a 150% no caso de falsificação de documentos. A correção pela Selic foi mantida. (RA)